Remember The Spiritual Life: 2011

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Morre John Stott - Líder e escritor anglicano

Aos 90 anos, John Stott deixou a Terra para se juntar aos anjos no céu. Hoje é um dia triste para todos os cristãos no mundo: um grande líder, um grande pensador, um grande cristão deixou a Terra. Mas também é um dia feliz: ele foi para o Reino. Além de tudo, ele também era um membro da Igreja Anglicana, mas sua mensagem ultrapassou as barreiras e ele tornou-se um dos mais reconhecidos cristãos da atualidade.

John deixou uma mensagem profunda: de que podemos e devemos ser semelhantes a Cristo.         Seu último livro, O Discípulo Radical, foi publicado no Brasil recentemente pela Editora Ultimato e John já sabia que este seria o último. E a mensagem que ele deixou continuou sendo a mesma e ainda mais desafiante.

John Stott foi, com toda a certeza, um discípulo radical que ele pregava. E com toda a certeza, nós sentiremos falta de alguém assim.

Vá em paz, John. Vá em paz.

Artigo extraído do site da Paróquia Anglicana de Todos os Santos.
http://www2.ptodosossantos.com.br/?p=660


terça-feira, 28 de junho de 2011


Do Editor


Segue abaixo artigo extraído do sitio Adital escrito por José Antonio Pagola, Teólogo e biblista espanhol que julgo trazer uma reflexão importante sobre Reavivar a memória de Jesus.

A crise da missa é, provavelmente, o símbolo mais expressivo da crise que se vive no cristianismo atual. Cada vez aparece com mais evidência que o cumprimento fiel do ritual da eucaristia, tal como ficou configurado ao longo dos séculos, é insuficiente para alimentar o contacto vital com Cristo que, hoje, a Igreja necessita.

O afastamento silencioso de tantos cristãos que abandonam a missa dominical, a ausência generalizada dos jovens, incapazes de entender e gostar da celebração, as queixas e pedidos de quem continua a assistir com fidelidade exemplar, gritam-nos a todos que a Igreja, no próprio centro das suas comunidades, necessita de uma experiência sacramental muito mais viva e sentida.

No entanto, ninguém parece se sentir responsável pelo que está acontecendo. Somos vítimas da inércia, da covardia ou da preguiça. Um dia, quem sabe não tão distante, uma Igreja mais frágil e pobre, mas com mais capacidade de renovação, empreenderá a transformação do ritual da eucaristia, e a hierarquia assumirá a sua responsabilidade apostólica para tomar decisões que hoje não nos atrevemos nem a expor.

Entretanto, não podemos permanecer passivos. Para que um dia se produza uma renovação litúrgica da Ceia do Senhor é necessário criar um novo clima nas comunidades cristãs. Temos de sentir de forma muito mais viva a necessidade de recordar Jesus e fazer da Sua memória o princípio de uma transformação profunda da nossa experiência religiosa.

A última Ceia é o gesto privilegiado em que Jesus, ante a proximidade da Sua morte, recapitula o que foi a Sua vida e o que vai a ser a Sua crucificação. Nessa Ceia concentra-se e revela-se de forma excepcional o conteúdo salvador de toda a Sua existência: o Seu amor ao Pai e a Sua compaixão para com os humanos, levado até ao extremo.

Por isso é tão importante uma celebração viva da eucaristia. Nela, atualizamos a presença de Jesus no meio de nós. Reproduzir o que Ele viveu no término da Sua vida, plena e intensamente fiel ao projeto do Seu Pai, é a experiência privilegiada que necessitamos para alimentar o nosso seguir a Jesus e o nosso trabalho para abrir caminhos ao Reino.

Temos de escutar com mais profundidade o mandato de Jesus: "Fazei isto em memória de Mim". No meio de dificuldades, obstáculos e resistências, temos de lutar contra o esquecimento. Necessitamos fazer memória de Jesus com mais verdade e autenticidade.

Necessitamos reavivar e renovar a celebração da eucaristia.

Tradução ao português de Portugal: Antonio Manuel Álvarez Pérez.
Fonte: Blogger do IAET
http://iaet.blogspot.com/

sábado, 5 de março de 2011

domingo, 23 de janeiro de 2011

:: Minha história :: Da comunicação à teologia

(ou de como Deus conduz as pessoas sem que elas percebam)

Meu nome é Maria Clara. Sou carioca, nascida e criada na Cidade Maravilhosa, e vibradora de suas belezas naturais, de sua gente, de sua música, e da luz do sol que se põe no fim do dia sobre a baía de Guanabara e suas ilhas.

Nasci a 19 de maio de 1949, filha única, neta única e sobrinha única. Talvez essa unicidade que me acompanha desde o nascimento me tenha instigado a ver – conduzida pela mão saudosa e amorosa de minha avó Antonietta – na Igreja Católica um lugar cheio de possíveis irmãos e primos com quem eu pudesse interagir e conversar. Realmente, foi e é na Igreja que encontrei meus melhores amigos, verdadeiros irmãos que me acompanham ao longo da vida.

Nasci Lucchetti, neta de italianos, catalães e portugueses. A 2 de junho de 1969 tornei-me Bingemer pelo casamento com um argentino filho de alemães que há trinta e oito anos me faz feliz e que me deu os três mais belos presentes de minha vida: meus três filhos: Maria Laura, Carlos Frederico, e Maria Cândida. Com eles formamos uma família que está crescendo. Desde o dia 25 de abril de 2007 sou avó de Maria Carolina, (Carol), uma linda menina de olhos grandes e claros e sorriso maroto. Filha de Lalá e Eduardo. Para o próximo mês de maio, há outro em caminho, filho de Carlos e Maria Isabel

Moça típica da minha geração, tranquei a faculdade de Comunicação que havia recém começado para seguir o marido por dois anos de Mestrado na Europa. Tempo maravilhoso, de construção de vida sem um vintém no bolso e uma filha recém nascida para cuidar. Tipicamente também, abalaram-se daqui para o Velho Continente minha mãe e minha avó a fim de conhecer a neném e ajudar-me em coisas que nos meus 20 anos não tinha a menor idéia, como trocar fraldas e preparar mamadeiras.

Ao voltar ao Brasil, em 1971, retomei a faculdade de Comunicação e entre outra gravidez e a vida de casada que começava a se reinstalar no país, terminei em 1975 o bacharelado em Comunicação Social na PUC do Rio. Foi quando, procurando um trabalho que não me tomasse o dia inteiro, por causa das crianças, fui convidada pelo então Padre Alfredo Novak (hoje bispo de Paranaguá, PR) a trabalhar na sede da Conferência dos Bispos do Brasil, que naquele tempo funcionava no Rio de Janeiro. Ali comecei a desenvolver a área de Meios de Comunicação audiovisuais.

Era uma época na qual a Igreja do Brasil aparecia como a única voz que se levantava para defender os direitos humanos e os bispos que se encontravam à freente da entidade, - Dom Ivo Lorscheiter, Dom Aloísio Lorscheiter e outros – apareciam-me como verdadeiros gigantes de fé e caridade ardente que fazia crescer o amor por minha Igreja. Foi este amor, acrescido da experiência pastoral que a CNBB me proporcionou que me imbuiu do desejo de estudar teologia. Não pensava deixara Comunicação, mas sim ter mais base para o trabalho que fazia.

A entrada na Faculdade de Teologia da PUC-Rio aconteceu em 1976, assim como a gravidez de minha terceira filha, que nasceu a 5 de abril de 1977. O sono e o enjôo que sentia durante as aulas não quebraram a fascinação de escutar as aulas de meu primeiro professor, o Pe. João Batista Libanio, que abria diante de meus olhos fascinados os caminhos da Teologia Fundamental, da fé e da revelação. O desejo de permanecer no terreno da Teologia e o estímulo de começar a ser convidada para dar assessorias e palestras sobre temas teológicos, juntamente com a mudança da CNBB do Rio rumo a Brasília acabaram de fazer-me tomar a decisão. Iria terminar a graduação, e ingressar no mestrado e depois no doutorado, a fim de servir a Igreja e poder ajudar a fazer crescer o Reino de Deus.

Foi nesta mesma época que se deu em minha vida um encontro decisivo com Inácio de Loyola. A experiência dos Exercícios Espirituais, método que Inácio deixou como legado à Igreja para buscar e encontrar a Deus em todas as coisas passou a moldar minha maneira de rezar e de viver. Foi sobre Inácio, portanto, e sua teologia trinitária que fiz minha tese de mestrado e depois de doutorado. Para a última, desloquei-me até Roma, na Universidade Gregoriana, defendendo-a a 3 de maio de 1989.

Após o doutorado, voltei à PUC , meu lar acadêmico desde sempre. Retomei as aulas, a pesquisa e a orientação de teses de mestrado e doutorado. Comecei a escrever para periódicos acadêmicos, a publicar livros e artigos e a assessorar dioceses, congregações religiosas e movimentos leigos sobre temas teológicos específicos.

Entre minhas linhas de pesquisa ao longo destes anos, ao lado dos sempre amados e nunca abandonados Santo Inácio e a Santíssima Trindade, estiveram : a Mulher e as relações de gênero, a mística inter-religiosa, a crise da modernidade e o pluralismo religioso. No momento, minha atenção se encontra voltada para o pensamento de uma filósofa que se tornou grande amiga, apesar de eu nunca te-la encontrado pessoalmente: Simone Weil. A partir dela, desdobrei novos caminhos de pesquisa, onde a violência, o diálogo inter-religioso e o gênero também estavam presentes.

Finalmente, nos últimos anos, a Comunicação vem voltando a minha vida, imbricando-se com a Teologia. Coordenando há quase 10 anos um Centro de fé e cultura da PUC, que se dedica à formação de leigos, comecei a ter oportunidade de maior visibilidade na mídia, em especial na televisão e nos jornais. E ao longo deste ano de 2002 assumi uma coluna quinzenal no Jornal do Brasil, desde onde procuro testemunhar a fé que me levou em seus caminhos desde criança e me fez assumir como missão o magistério teológico. O retorno que recebo dos leitores e o apoio que tenho tido dos companheiros de caminhada me confirma nesse caminho por onde o Senhor me tem conduzido ao longo de toda a vida. E agora, desde 11 de março de 2004 sou decana do Centro de Teologia e Ciencias Humanas da PUC-Rio (http://www.ctch.puc-rio.br/conteudo/home.asp).
Maria Clara Luchetti Bingemer
(decana do Centro de Teologia e Ciencias Humanas da PUC-Rio
 (http://www.ctch.puc-rio.br/conteudo/home.asp).





http://wwwusers.rdc.puc-rio.br/agape/apost/retiros.htm

sábado, 22 de janeiro de 2011

::: MODELOS DE MINISTÉRIO PASTORAL :::

"MODELOS DE MINISTÉRIO PASTORAL" 
                      John Sttot
Que os homens nos considerem, pois, como ministros de Cristo, e despenseiros dos mistérios de Deus.
Ora, além disso, o que se requer nos despenseiros é que cada um seja encontrado fiel. Todavia, a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós, ou por qualquer tribunal humano; nem eu tampouco a mim mesmo me julgo. Porque, embora em nada me sinta culpado, nem por isso sou justificado; pois quem me julga é o Senhor. Portanto nada julgueis antes do tempo, até que venha o Senhor, o qual não só trará à luz as coisas ocultas das trevas, mas também manifestará os desígnios dos corações; e então cada um receberá de Deus o seu louvor. Ora, irmãos, estas coisas eu as apliquei figuradamente a mim e a Apolo, por amor de vós; para que em nós aprendais a não ir além do que está escrito, de modo que nenhum de vós se ensoberbeça a favor de um contra outro. Pois, quem te diferença? E que tens tu que não tenhas recebido? E, se o recebeste, por que te glorias, como se não o houveras recebido? Já estais fartos! Já estais ricos! Sem nós já chegastes a reinar! E oxalá reinásseis de fato, para que também nós reinássemos convosco!

Porque tenho para mim, que Deus a nós, apóstolos, nos pôs por últimos, como condenados à morte; pois somos feitos espetáculo ao mundo, tanto a anjos como a homens. Nós somos loucos por amor de Cristo, e vós sábios em Cristo; nós fracos, e vós fortes; vós ilustres, e nós desprezíveis. Até a presente hora padecemos fome, e sede; estamos nus, e recebemos bofetadas, e não temos pousada certa, e nos afadigamos, trabalhando com nossas próprias mãos; somos injuriados, e bendizemos; somos perseguidos, e o suportamos; somos difamados, e exortamos; até o presente somos considerados como o refugo do mundo, e como a escória de tudo. Não escrevo estas coisas para vos envergonhar, mas para vos admoestar, como a filhos meus amados.

Porque ainda que tenhais dez mil aios em Cristo, não tendes contudo muitos pais; pois eu pelo evangelho vos gerei em Cristo Jesus. Rogo-vos, portanto, que sejais meus imitadores. Por isso mesmo vos enviei Timóteo, que é meu filho amado, e fiel no Senhor; o qual vos lembrará os meus caminhos em Cristo, como por toda parte eu ensino em cada igreja. Mas alguns andam inchados, como se eu não houvesse de ir ter convosco. Em breve, porém, irei ter convosco, se o Senhor quiser, e então conhecerei, não as palavras dos que andam inchados, mas o poder. Porque o reino de Deus não consiste em palavras, mas em poder. Que quereis? Irei a vós com vara, ou com amor e espírito de mansidão? (i Corintios 4) Paulo nos dá um modelo de ministério cristão. Este é um tema sobre o qual atualmente há muita confusão. O que é o clérigo ou o pastor ordenado? A que se assemelha, ao sacerdote católico ou ao presbítero da tradição reformada? É pastor, evangelista, profeta, pregador? É psicoterapeuta, administrador, trabalhador social? Esta indefinição do perfil do ministro cristão não é nova. Ao longo da sua história, a igreja tem oscilado entre os extremos do clericalismo e o anticlericalismo, às vezes exaltando aos ministros e outras os considerando imprescindíveis. Mark Twain inclui uma cena expressiva em sua conhecida novela, As aventuras de Huckleberry Fynn. Huck relata a uma jovem que, na igreja quefreqüenta seu tio, na Inglaterra, havia pelo menos 17 clérigos, ainda que nem todos pregavam no mesmo dia. Johanna pergunta a ela o que fazem os restantes clérigos, e Huck responde: “Não muito. Vão de um lado para outro, passam o prato para as ofertas, mas não muito mais”. “Então para que estão lá?”, pergunta sua amiga. E Huck responde: “Bem, é para manter o estilo. Acaso você não entende nada de estilo?”
                                                     A liderança cristã
Quando lemos a carta de Paulo ao Corintios, vemos que desde o começo houve percepções erradas sobre o lugar do ministro ordenado. As facções em Corinto brigavam entre si para apoiar um líder em particular, e Paulo reage horrorizado por este culto aos líderes. Para corrigir o conceito dos corintios, o apóstolo desenvolve quatro modelos do que é o ministério de um pastor ordenado. Ainda que descreva seu próprio ministério apostólico, as figuras também se aplicam ao ministério cristão atual. Cada modelo ou metáfora ilustra uma verdade essencial sobre a liderança cristã.
                                                     Servos de Cristo
Antes de ser ministro da Palavra ou da igreja, os líderes são ministros ou servos de Cristo. Sem dúvida, existem passagens da Bíblia que enfatizam a honra do ministério cristão e motivam à igreja a ter estima e amor pelos que desempenham essa função. Mas aqui, Paulo usa uma expressão de muita humildade; o termo grego que se traduz como “servo” é uperetes. É interessante a origem desta palavra. Os barcos do mundo antigo tinham três níveis de remadores. Osuperet es eram os que estavam no nível mais baixo do barco, figura de humildade e trabalho forçado. Paulo descreve ao ministro como subordinado a Cristo, alguém que ocupa um nível de humildade. O ministro cristão deve começar com uma atitude de submissão e amor ao Senhor, com o encontro diário com Deus em oração e uma vida de obediência.

Como subordinados de Cristo, somos responsáveis perante ele por nosso ministério. O fato de termos que dar conta a Deus do nosso trabalho nos consola ao mesmo tempo que nos desafia. Nos consola porque podemos dizer, como Paulo, que o Senhor é quem nos julga. Perante Ele ficaram à vista as intenções do coração.

Não há porque fazer comparação, diz o apóstolo. Se há diferença entre pessoas, por acaso não é Deus responsável por elas? Os dons que temos os temos recebido de Deus. Nossa responsabilidade final é ante Deus. Logicamente, devemos escutar a critica humana, ainda que em algumas ocasiões pode ser dolorosa. A crítica nem sempre é justa nem amável. Sem dúvida Jesus Cristo é mais misericordioso que qualquer juiz humano. As cartas anônimas, por exemplo, costumam ser muito agressivas, porque o autor não se identifica. Com o passar dos anos, aprendi a não levar a sério as cartas anônimas.

Ao final do século passado, um famoso pregador subia ao púlpito, quando uma senhora lhe atirou um papel. Ele o pegou e leu a única palavra que dizia: “tonto”. Começou seu sermão dizendo: “Tenho recebido durante minha vida muitas cartas anônimas, mas é a primeira vez que recebo a assinatura sem o texto.” Se o autor não está disposto a identificar- se, não podemos tomar sua crítica como algo sério. Uma vez que nos traz ânimo saber que nosso juiz final é o Senhor, ser responsáveis perante Deus é também um enorme desafio. Grande parte do trabalho de um ministro ou pastor não se conhece nem se supervisiona. No entanto, sempre estamos na presença de Deus e algum dia vamos ter que prestar contas a Ele.
                                               Mordomos da revelação
Que os homens nos considerem, pois, como ministros de Cristo, e despenseiros dos mistérios de Deus. Ora, além disso, o que se requer nos despenseiros é que cada um seja encontrado fiel. Todavia, a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós, ou por qualquer tribunal humano; nem eu tampouco a mim mesmo me julgo. Porque, embora em nada me sinta culpado, nem por isso sou justificado; pois quem me julga é o Senhor. Portanto nada julgueis antes do tempo, até que venha o Senhor, o qual não só trará à luz as coisas ocultas das trevas, mas também manifestará os desígnios dos corações; e então cada um receberá de Deus o seu louvor.(I Corintios 4:1-5)

Os ministérios de Deus não ficaram ocultos, reservados somente para pessoas elegidas. Seus ministérios são segredos proclamados à humanidade para que possamos conhecer a Deus e viver em relacionamento com Ele. Deus se deu a conhecer, acima de tudo, em Jesus Cristo. As verdades sobre Jesus Cristo, Sua pessoa e Sua obra, só podem ser conhecidas através da revelação do Espírito. Os apóstolos foram os primeiros mordomos da mensagem, por quanto receberam a revelação para que conhecessem os mistérios de Deus. Depois deles, também os pastores são mordomos da revelação, porque Deus lhes confiou o ensinamento das Escrituras.

De acordo com o Novo Testamento, a primeira responsabilidade do ministro é ensinar ao povo de Deus; quer dizer, alimentar ao rebanho. Em I Timóteo 3:2-3, o apóstolo Paulo dá uma lista de requisitos para o ministro. Enumera qualidades morais muito importantes e, na mesma lista, inclui o que poderíamos chamar de uma “aptidão profissional”: o pastor deve ser apto para ensinar, para nutrir as ovelhas.

É interessante observar, no campo, que os pastores não alimentam as ovelhas, salvo se estejam doentes. Sua tarefa, na realidade, é as conduzir até os pastos, onde as ovelhas se alimentam a si mesmas. Assim deve fazer o pastor na igreja: guiar aos crentes à Palavra, para que se alimentem dela. Os pastores ensinam o que lhes foi dado, quer dizer, a mensagem bíblica. Exige-se dos ministros que sejam mordomos ou administradores fieis daquilo que lhes foi confiado. É fácil se transformar em um mordomo infiel da mensagem, e é triste que existam muitos deles na igreja contemporânea. Alguns descuidam do estudo da Palavra de Deus ou a lêem de maneira ocasional e superficial. Outros não conseguem vincular o texto bíblico ao mundo atual, e outros manipulam o texto para que diga o que eles querem que diga. Há pastores que selecionam das Escrituras só o que eles gostam dela. Todos estes são exemplos de infidelidade. As congregações vivem, crescem e florescem pela Palavra de Deus. Sem ela, adoecem e morrem. Por isso é tão importante que o ministro ordenado tenha hábitos disciplinados de estudo e que investigue tanto o mundo antigo como o atual, para que seu ensinamento seja completo nutritivo. Imaginemos uma planície cortada por um abismo profundo. Um lado da planície representa o mundo bíblico e o outro o mundo contemporâneo. Entre o mundo bíblico e o mundo atual, temos um profundo “cânion de 2.000 anos”, dois milênios de mudanças culturais. Apliquemos este diagrama à tarefa de pregação. Nós os evangélicos vivemos do lado da planície que representa o mundo bíblico. Somos homens e mulheres que cremos ma Bíblia, a amamos e a lemos. Não nos sentimos muito a vontade no lado que representa o mundo atual e até nos sentimos ameaçados por ele. Nem nos ocorreria pregar outra coisa que não fosse o texto bíblico. Mas pode acontecer que a mensagem nunca “aterrisse” do outro lado do abismo. É bíblico, mas esta enraizada na realidade contemporânea. Esta é uma debilidade característica dos pregadores evangélicos. Os liberais cometem o erro oposto. Se sentem cômodos na cultura moderna, mas perderam a essência da revelação bíblica. Sua mensagem é aceita pelo mundo, mas não é bíblica. Esta é uma das tragédias da igreja hoje: os evangélicos são bíblicos mas não contemporâneos, e os liberais são contemporâneos mas não bíblicos. Poucos são os pregadores e mestres que constroem pontes para unir os dois mundos: o bíblico e o contemporâneo. Mas este é o desafio que temos. A única maneira de sermos bons mordomos da revelação de Deus é relacionar a Palavra com o mundo, e para isso devemos estudar e compreender os dois lados deste “abismo”.

Pessoalmente, estou muito agradecido a Marin Lloyd Jones, quem me apresentou fazem mais de trinta anos um pequeno calendário de leituras bíblicas, que havia preparado um clérigo em 1842, para sua consagração na Escócia, com o propósito de que lesse a Bíblia todo ano: o Antigo Testamento uma vez, e o Novo duas. Ainda que se requeira ler quatro capítulos por dia, o método é de muito benefício. Não se começa lendo Gênesis, para seguir em forma contínua, senão que se começa simultaneamente nos quatro grandes inícios da Bíblia: Gênesis 1, Esdras1, Mateus 1 e Atos 1. Estes são quatro grandes nascimentos: Gênesis relata o nascimento do universo e Esdras o renascimento da nação, depois do cativeiro babilônico. Mateus 1 o nascimento de Cristo; e Atos 1 é o nascimento da igreja. Minha própria prática é ler três capítulos cada manhã; dois deles corridos, e o terceiro para meditar e estudar. Reservo o quarto para a tarde. Este enfoque ajuda a integrar a mensagem global das Escrituras. Minha recomendação é que procuremos, com este ou qualquer sistema, ler a Bíblia completa todo ano.

Por sua vez, precisamos relacionar a Bíblia com a realidade atual. Fazem uns trinta anos, comecei um grupo de leitura em Londres, ao que convidei a uns quinze jovens profissionais, homens e mulheres, que estavam comprometidos com a Palavra e desejavam as aplicar em seu âmbito cultural. Este grupo de leitura tem se mantido; nos reunimos somente de quatro a seis vezes por ano, em cada reunião decidimos que livro vamos ler antes do próximo encontro. Escolhemos livros populares, que estão produzindo impacto no pensamento moderno; às vezes escolhemos um filme. Quando nos reunimos, cada membro do grupo dispõe só de um minuto para definir qual o principal assunto que, pelo seu entendimento, o autor está enfocando. Dedicamos umas duas horas para refletir e discutir sobre esses temas, e durante a última meia hora, nos fazemos a seguinte pergunta: O que diz o evangelho às pessoas que pensam desta forma e vive nesta realidade? Estes encontros me têm ajudado muitíssimo a entrar no mundo moderno e estender uma ponte a partir da Bíblia até os problemas atuais. Reuniões deste tipo, com profissionais ou estudantes, membros de nossa igreja ou amigos em geral, são um espaço fecundo e desafiante para construir pontes entre a revelação de Deus e o mundo contemporâneo.
                                                 Escória do Mundo
Já estais fartos! Já estais ricos! Sem nós já chegastes a reinar! E oxalá reinásseis de fato, para que também nós reinássemos convosco! Porque tenho para mim, que Deus a nós, apóstolos, nos pôs por últimos, como condenados à morte; pois somos feitos espetáculo ao mundo, tanto a anjos como a homens. Nós somos loucos por amor de Cristo, e vós sábios em Cristo; nós fracos, e vós fortes; vós ilustres, e nós desprezíveis. Até a presente hora padecemos fome, e sede; estamos nus, e recebemos bofetadas, e não temos pousada certa, e nos afadigamos, trabalhando com nossas próprias mãos somos injuriados, e bendizemos; somos perseguidos, e o suportamos; somos difamados, e exortamos; até o presente somos considerados como o refugo do mundo, e como a escória de tudo. (I Corintios 4:8-13) Esta descrição nos causa impacto: Paulo declara que os que servem a Cristo como mordomos da revelação de Deus chegaram a ser como escória, e refugo do mundo. Nos versículos anteriores, o apóstolo escreve com certo sarcasmo: os corintios crêem que já reinam, e bom seria reinar com eles. O apóstolo, no entanto, sabe que o caminho à glória é o sofrimento. O foi para Jesus e o é para nós. Paulo usa duas ilustrações muito vívidas, ambas tomadas do mundo romano. Com elas, Paulo opõe seus próprios sofrimentos à comodidade dos corintios, e contrasta seu sentimento de ser ridicularizado, com a pretendida superioridade deles. Menciona, no primeiro caso, o espetáculo dos gladiadores que se apresentava no anfiteatro nas grandes cidades.

Diante de uma multidão, se jogavam à arena alguns criminosos para que enfrentassem aos leões e aos gladiadores. Paulo afirma que os ministros são como espetáculo para todo mundo, até para os anjos, em uma espécie de teatro cósmico no qual são jogados como se fossem criminosos. O apóstolo faz outra comparação, esta vez com os sacrifícios humanos. Paulo alude a uma cidade grega imaginária, assolada por uma calamidade; para apaziguar a ira dos deuses, se costumava jogar alguns miseráveis ao mar. Às pessoas sacrificadas eram chamadas depericatar mata; o apóstolo se compara a eles. Somos isto para o mundo: escória, refugo, algo que não merece estar em nenhum lugar. Quiçá tudo isto nos parece alheio e pouco aplicável a nossa vida. Se é assim, poderia indicar quanto temos nos apartado do Novo Testamento. Hoje é respeitável ser pastor, mesmo em uma sociedade não cristã. Alguns países dão algumas honras e concessões aos clérigos, como os eximir de impostos ou os chamar de “reverendo”. Não era assim no princípio, e não deveríamos aceitar a situação tão comodamente. É um grande risco chegar a ser um pregador popular. É muito difícil ser popular e ao mesmo tempo ser fiel. A cruz de Cristo continua sendo loucura para alguns e pedra de tropeço para outros. Quando pregamos a cruz desafiamos o orgulho humano, porque o evangelho chega como um dom gratuito e imerecido.

O ser humano preferiria fazer algo para ganhar sua própria salvação ou, pelo menos, contribuir com ela. Pregar, como declara a Bíblia, que ninguém pode contribuir em nada, traz humildade e desperta hostilidade. O evangelho também produz recusa porque afirma que Jesus Cristo é o único Salvador. Essa mensagem ofende o mundo pluralista. Em uma cultura que sustenta a validade de todas as religiões, declarar que só o evangelho é a verdade de Deus, o torna antiquado e ofensivo. Por último, o evangelho exige que nos submetamos ao senhorio de Cristo e vivamos em santidade debaixo das suas normas morais. A maioria dos seres humanos preferem viver da sua maneira, com suas próprias leis. Para eles, o evangelho é pedra de tropeço. Sendo assim, os que pregam e ensinam a Palavra devem estar dispostos a ser tidos por loucos pela causa de Cristo. Estou convencido que se fossemos realmente fiéis a Jesus Cristo sofreríamos mais. O certo é que temos eliminado do evangelho os aspectos pouco populares e, dessa forma, evitamos oposição e perseguição. Dietrich Bonhoefeer, o pastor luterano que foi executado em um campo de concentração, em abril de 1945, escreveu O custo do discipulado enquanto definhava na prisão. Ali definiu o discipulado como uma “aliança com o Cristo sofredor”. O sofrimento é a marca, o selo do autentico cristianismo; é o que confirma nossa identidade como discípulo de Jesus Cristo.

Matinho Lutero, por sua vez, concebia o sofrimento como um dos sinais da igreja verdadeira, à qual descreve como “a comunhão daqueles que são perseguidos e martirizados pela causa do evangelho”. Se nossa vida se desenvolve com total comodidade, se ninguém se opõe a nosso testemunho, deveríamos perguntar se realmente somos fiéis discípulos de Jesus Cristo e servos de sua igreja ou estamos, mais bem, adaptados e cômodos no mundo.
                                           Pais da família que é a igreja
Não escrevo estas coisas para vos envergonhar, mas para vos admoestar, como a filhos meus amados. Porque ainda que tenhais dez mil aios em Cristo, não tendes contudo muitos pais; pois eu pelo evangelho vos gerei em Cristo Jesus. Rogo-vos, portanto, que sejais meus imitadores. Por isso mesmo vos enviei Timóteo, que é meu filho amado, e fiel no Senhor; o qual vos lembrará os meus caminhos em Cristo, como por toda parte eu ensino em cada igreja. Mas alguns andam inchados, como se eu não houvesse de ir ter convosco. Em breve, porém, irei ter convosco, se o Senhor quiser, e então conhecerei, não as palavras dos que andam inchados, mas o poder. Porque o reino de Deus não consiste em palavras, mas em poder. Que quereis? Irei a vós com vara, ou com amor e espírito de mansidão? (i Corintios 4:14-21)

A quarta metáfora ou modelo que Paulo apresenta, descreve aos pastores como pais da família da igreja. No parágrafo final, o apóstolo se refere aos corintios como “seus amados filhos”. Quiçá tenham dez mil mestres ou tutores que os disciplinem, mas não têm muitos pais que os amem. Ele foi seu “pai” no evangelho. Paulo inclusive insta aos corintios a o imitar. Em Mateus 23, Jesus disse que não deviam chamar ninguém de “pai” senão Deus. Está Paulo contradizendo os ensinamentos de Jesus? Quando o Senhor fez esta recomendação, o contexto se refere à autoridade ou a propriedade de uma pessoa a outra. Não devemos permitir que nenhum ser humano nos considere sua possessão. Só Deus é nossa autoridade absoluta. Ele é nosso Pai. Mas em sua carta, Paulo estava se referindo ao carinho, ao amor de um pai. Nesse sentido se considera a si mesmo como um pai dos crentes corintios. Quando escreve aos tessalonicenses, não somente se compara com um pai senão que lhes diz que se sente como uma mãe para aqueles a quem ajudou a nascer em Cristo.

Esta é uma bela imagem do apóstolo Paulo, um homem ao qual costumamos imaginar severo e ainda tosco. No entanto, quando fala de seu ministério pastoral, usa uma figura de tanta suavidade, afeto até sacrifício por seus filhos na fé. Sem dúvida, é legitima a disciplina na igreja, e sempre que se exerça em forma comunitária. Contudo, o apóstolo mostra que a característica principal dos pastores cristãos não é a severidade, senão mais bem a gentileza. Nos diferentes lugares nos quais tive o privilegio de estar, chego à mesma conclusão: na igreja necessitamos menos autoritarismo, menos liderança personalista, e mais afeto e bondade para com a congregação. Cremos realmente no sacerdócio de todos os crentes? As vezes o governo da igreja se parece mais ao “papado de todos os pastores”, e essa não é a doutrina evangélica. Nós que servimos a uma congregação podemos, como escrevia o ministro escocês sua própria experiência, “nos apaixonar pela congregação”. Este pastor comparava sua relação com o “florescer do coração que ocorre em qualquer outra paixão” e esta vivencia o motivava para fazer tudo para o bem daqueles a quem servia. Essa deveria ser a marca do pastor autêntico.
                                                A humildade no serviço
Estas quatro imagens com as quais o apóstolo descreve seu ministério apostólico são aplicáveis aos ministros na igreja hoje, se bem que estes não são apóstolos. O denominador comum a estas quatro metáforas é uma atitude característica mesmo de Jesus Cristo: a humildade. O apóstolo expressa que, como líderes, necessitamos ser humildes ante o Senhor, de quem somos subordinados; humildes ante a Palavra de Deus, da qual somos mordomos; humildes ante o mundo, cuja oposição temos que enfrentar; e finalmente, humildes ante a congregação, ante os crentes aos quais amamos e servimos. Procuremos que nosso ministério se caracterize, acima de todas as coisas, pela gentileza e a humildade de Jesus Cristo. Ele é que nos chamou ao ministério e estabeleceu as normas para exerce-lo. Como líderes, estamos realmente subordinados a Cristo? Somos mordomos fiéis da sua revelação? Estamos dispostos a sofrer por Ele? Somos como um pai e uma mãe para Sua igreja? Damos graças a Deus pelo privilégio que temos: não só somos membros da Sua igreja, senão que fomos chamados a ser pastores e ministros nela. Peçamos-lhe perdão pela maneira com que não temos seguido as normas bíblicas para exercer o ministério. Procuremos ser mais fiéis no estudo e na exposição de Sua Palavra, mais dispostos a sofrer por causa do evangelho, e mais amáveis e gentis para com a congregação. Então seremos uma igreja verdadeiramente viva. O Espírito Santo se mostrará plenamente no louvor e na adoração, no amor entre os irmãos, na fidelidade à Palavra e na evangelização ao mundo necessitado. Que assim seja.